FOME
O POETA E A CHUVA
[Lembrando de Manuel Bandeira
e Machado de Assis, meus mestres]
A chuva fina cai sobre
a fria cidade.
Um poeta conta
os pingos da chuva.
Na verdade,
arquiteta um plano de fuga
para um outro planeta,
um planeta longínquo,
um planeta onde o futuro seja possível
e que não tarde a chegar.
Impossível contar
os pingos da chuva.
Ele arremessa, então,
os seus versos livres
à chuva,
certo de que sentirão de perto
“o cheiro do ralo”.
Como acabar com a fome no mundo?
O que fazer para alimentar
seres humanos
que procuram comida
no lixo?
O poeta sonha
com outro mundo.
O poeta está louco.
Qualquer dia
o internarão num manicômio,
na Casa Verde, talvez,
na vizinha Cidade de Itaguaí.
NELSON MARZULLO TANGERINI