Poética - Medusa
Nas várzeas sombras que se enroscam em nossa luz e projetam-se nas paredes do tempo, engendram-se as serpentes da sordidez humana, e junto a elas, a languidez viscosa do fruto criativo da vida.
Sob a aurora, todos tendem a reprimir as sombras que serpenteiam o espírito humano, fazendo-as fervilhar ainda mais nos cárceres da mente já envenenada.
Doravante, nas brasas do poente o sol se dilui, e a lua, tal como um ninho de pestilências, desvela o reflexo dos dramas sepultados no negrume dos nossos crânios.
Nessas cavernas profundas, adormecem todos os mistérios celestes da criação, e na tentativa de que a nódoa da alma se desfaça; muitos são os que procuram ilusoriamente purifica-la.
"Os amordaçados pelo falso moralismo, estremecem ao fitarem o próprio ninho de serpentes e tentam extirpa-las, cuspindo-lhes a vileza de dentro para fora.
Ao destilarem o veneno das inquisições diárias, eles plasmam a substância da própria monstruosidade em outrem.
Transformando a si mesmos em esculturas do próprio medo.
E quão profundos são os olhos daqueles que refletem a vida em sua forma mais pura; são mandalas escuras que sublinham o reflexo
pútrido dos escravos da hipocrisia.
São abismos que se nutrem com as serpentes que sufocamos em nossos jardins estéreis.
São os espelhos das nossas limitações."
O que é o preconceito se não uma confissão da nossa própria miséria?
Uma tentativa de exorcizar no outro, aquilo que jaz entranhado em nós.
- Letícia Sales
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