PRETO & BRANCO

Minha pele sempre chega primeiro.

Do coldre do policial a arma me espia.

Os olhos do néo-nazista me fuzilam.

O porteiro do prédio me ausculta.

A mulher desvia para a outra calçada.

O vendedor se arrepia quando entro na loja.

A calçada é minha cama.

O papelão é o meu colchão.

As estrelas, minha coberta.

Diz o poeta:

a negra noite, linda, desce à Terra...

A madrugada é voz de prisão.

A igreja é só para pedir perdão.

Crianças bem educadas sorriem para mim.

Crianças mal educadas apertam a mão da mãe.

Smoking's entram nas festas mais chiques.

Negro de moto potente? Foi roubo...

Negro olhando a moto potente? Vai roubar...

A pele, por mais que releve,

a minha alma não revele...

Diz o poeta:

Negros, índios, amarelos, pobres, ricos,

todos iguais são caminhando sobre este chão,

em cada um pulsa o verdadeiro coração...