Morador de rua

Deitando palavras numa calçada fria

No calor dos corpos, a solidariedade

Sempre mãe, a paixão se veste de caligrafia

Da razão não foi encontrada paternidade

E vão se emendando para contar histórias

Pois este é o seu fim, sua sina

E se na harmonia de um ritmo, a glória

Narrar um enredo abrigado numa rima

Como a do homem acertando suas arestas

Na lixa grossa da realidade crua

Das certezas antes manifestas

Sobrou o silêncio imposto como lição das ruas

Mastigando sua existência indigesta

Seria teimosia ou preguiça de morrer

De sua dieta abjeta

Regurgita o que lhe obrigam a comer

E encharcado com seu vômito

O nariz adaptado à condição

Empenho de sobreviver que parece indômito

Repugnância alheia até lhe causa satisfação

Pois não terá tapete capaz de esconder

Não tem descarte para o lixo desta sociedade

Por seus filhos terão que responder

Geração da sua falta de capacidade

Aqui não existe orfanato

E seus rebentos gritam de fome

Mas ninguém virá tirar a guarda por maus-tratos

E a vergonha manterá o seu sobrenome.