SORRISO NEGRO DE MARIELLE
Sim, mataram a Marielle!
Mas como se ainda há pouco
Aludia-se à espantosa força
Das vozes nos vivos guetos
Num voto audaz da favela?
Mataram sim, as Marielles...
Por quê? Porque havia dúvidas
Das suas diversas formas de amar
No gozo de uma música inusitada
Nos barracos, nas ruas e nas vielas?
Matam! Marielles são mortas!
Senão pelas mãos dos que as afagam
No corpóreo domínio e no estupro,
Ou pelas mortes antes anunciadas
Nos números ligeiros que as calam?
Mas matam! Marielles são mortas!
Senão por que são jovens felizes
No limbo de uma oficial história...
Ou porque seriam em sexo diverso
E não caberiam na ferina escória?!
Matam, mataram a Marielle!
Onde? Em nossas próprias casas
No estridente discurso da mentira.
Ou nas ruas? Nas esteiras do ódio
Que apodrecem numa fatal loucura.
Matam, mataram a Marielle!
Por sua imagem...o sorriso negro
Que desancava a senil escravatura
Denunciando o nexo entre o medo
E a ordem branca da fabril ditadura?
Matam, não apenas a Marielle!
Mortas muitas, os corpos suaves
Abrejados nos fundos subúrbios
Compartilhados pelos celulares,
Sucursais de notícias e entulhos?
Mas matam! Marielles são mortas!
Senão pelo abuso e o descaso
Que a guerra civil sempre nos traz:
As jovens, Marielles das periferias,
Jazem, pelas manhãs, corpos já frios...
Aquelas que enganariam os destinos,
Já perdidos, na cilada da democracia!
Mas como as matam? Marielles são mortas:
Friamente, nos negados e inférteis sonhos
Estatalmente, na falência dos seus direitos
De quem só se cala, mas não consente
As mortes várias da vida, diuturnamente!
Matam, mataram friamente Marielle!
Por aquilo que querem esconder:
O conluio entre o militar e o roubo
O contrato do capital com o vício
Nas entranhas de todo poder!
Então ao ler a notícia, denuncia:
Matam, mataram a Marielle, sim!
Assim, como hoje nos furtam todos
Os frutos arrastados para a escuridão
No opressivo e veloz golpe da traição!
Poema classificado no Concurso de Poesia da Universidade Federal de São João Del Rei, ano 2019.