Aos corajosos, peço parem.

Mas por quais princípios?...

Eles não se escondem.

Que é isso?!

É demais sua valentia.

Que coragem de bicho.

Sai ele por aí como frango que escapuliu da granja .

Vai morrer .

Vai ser despenado.

Hoje mesmo vira canja.

Que força de viver mais estranha.

Sair de casa com a corda no gogó.

Voltar com o nó já no osso .

Calejado esse pescoço.

Preto, pro cê aplausos é pouco.

Preto, preto mesmo.

Nego drama, mudo .

Preto amarelado.

Preto no conteúdo.

Falo sério com cês tudo.

Preto é a cor dos destemidos.

O problema é que estamos perdendo só pretos com isso.

Que ousadia .

Sair de casa em meio a procura.

A caça.

Eles com sirenes.

Aceleram a viatura.

Procuram uma pele escura.

Onde tem .

Tem Aqui.

Tem aí Também.

Tem preto por todo lado.

Preta sou eu aqui meu bem.

Sou corajosa também.

Mais só um pouquinho.

Me ponho mesmo a chorar .

Me indigno.

Quando o que encontram de pretos são só neguinhos.

Recém pintados.

Nem entenderam disso tudo ainda.

Sabem de nada dessa coragem.

Sabem de nada dessa vida.

Aos corajosos,

peço parem.

Larguem mão dessa coragem.

Deixe de acostumar com a dor.

A caçada é traiçoeira.

Guerra de preto com sua canseira.

Um dia da caça outro do caçador?

Que bobeira.

Um dia o caçador se diverte na sua tremedeira.

No outro ele te mata, só por brincadeira.

Preto chora.

Já passou da hora.

Preto se tu for amarelo chore com agente.

Na caça calada.

O amarelo e o preto é muito tido como o mesmo.

Preto chora.

Deixa essa valentia.

Resistência preta.

Branco ignora.

Vai preto desmorona.

Esperneia.

Soluça.

Despeja catarro.

Faz fumaça.

Para tudo.

Deixa o centro lotado.

Chora preto,

Você não é alienado da sua própria sofridão.

Chora preto no meio da rua.

Chora a multidão.

Chora tanto pra que possamos chorar na televisão.

Tá birrando até agora. No planalto .

Tem preto chorando no senado em votação.

Chora pelo preto você que é descendente do povo mal falado.

Você que é descendente avergonhado.

Afrodescia tá aí .

Em tudo que é lado.

Mas tem também o outro lado.

A descendência dos coroados.

Vivemos ambos como no passado.

Uns na nobreza .

Outros como escravos.

Escravos sabe de quem?...

Mas que culpa tenho de ter sangue português.

Tem a culpa que julgamos não carregar mais Isabel.

Depois que liberto o povo preto foi.

Chora com o preto Branco.

Nem era pra ter isso.

Nome dividindo.

Não há afrodescendentes.

Nem herdeiros dos portugueses.

Só tem brasileiros.

Chora herdeiro com o preto.

Chora logo pra vê se dá jeito.

Chora pelo menos pelos jovens...

Pelas crianças.

Eram sem defeitos.

Chorem pelas mães que choram por dó de ver que junto do filho morreu a esperança.

Chora por nenhum de nós não branco herdeiro.

Chore por você mesmo.

Chora pelo sonho do novo mundo.

Que tanto o que sofre preto.

Quanto o que vive branco .

Tem de resquícios do sangue de Portugal.

Chora pela morte da vontade de andar no paraíso.

Vontade igual a dos seus.

Igual de vontade.

Igual de existência.

Chore por empatia.

Chore pra limpar sua consciência.

Chore pelo pranto do seu Deus.

Que chora porque também é Deus meu.

Chore.

Por esses que já foram julgados.

Não sei se ao morrer como recorrente nessa fé que caminhamos.

Ou mesmo ao nascer

nessa hipócrisia melódica que dançamos.

Julgados .

Julgados, carnes podres.

Condenados ao interro.

Sem velas.

Essa alma quem vela?

Essa cor no breu...

Quem vê ela?

Injustiça obrigado,

por depois de tanto.

Não ter deixado nunca mais cessar o tal pranto.