Enquanto...
Enquanto nós fudemos
do lado de fora o tempo não para
os carros perdem muito tempo parados
em congestionamentos intermináveis
pessoas enfadadas do trabalho exaustivo
só querem chegar em casa e mais nada
os metrôs disparam de uma ponta a outra
da cidade e ainda não dão conta
jovens com insônia
nos altos edifícios de ferro
e concreto se viram de um lado
para o outro na cama
esperando ansiosamente
dar o efeito do remédio.
Enquanto nós fudemos
há quem chore, há quem brigue
e pior de tudo, há quem não sinta o amor
há pessoas em todo canto fazendo guerra
espalhando o ódio e o horror.
Enquanto nós fudemos
litros sangue são derramado
nas calcadas a troco muitas vezes de nada
mães ficam sem filhos
filhos tiram a vida dos próprios pais.
Enquanto nós fudemos
do lado de fora tudo é solidão
há pessoas famintas nas ruas
dormindo ao relento
comendo no chão
sem identidade
invisíveis para sociedade
sujos e fedidos
de olhar distante.
Enquanto nós fudemos com força
já quase gozando de prazer
há um mundo preso em si mesmo
mendigando migalhas
de pertencimento
que por mais que a gente procure
não consegue ter.
Enquanto nós fudemos
nosso gozo escorre pelo ralo
desce pelos canos do prédio
sem destino certo
em direção ao abismo
e aquele prazer que antes sentimos
já não nos incomoda mais.
E depois quando a divisão
da nossa intensidade acaba
o que perpetua entre nós
é silêncio, é o espanto
é filme de terror.
Eu não reconheço mais seu corpo
e você não reconhece mais o meu
então nos esquecemos
e viramos cada um de costas
para o outro
agora eu só quero ficar sozinho
mesmo com você perto de mim
então olho pela janela do apartamento
fecho os olhos
e tento a todo custo dormir.