penas

que pena!

que os secularmente oprimidos no mundo

prefiram agora explodir bombas em igrejas e feiras

e destroçar tantos inocentes

a construir paz e justiça duradouras

que pena

que o mercado tornou-se um deus

que tantos obstinados veneram

que pena

que as pessoas se curvem mais

à televisão e às redes sociais

que à sincera intuição

que pena

que o mundo globalizado

ao invés de aproximado

esteja cada vez mais segregado

que pena

que não saibamos mais distinguir

entre oportunistas e estadistas

que pena

que o embotamento do nosso discernimento

seja planejado pela mídia golpista

que distorce a verdade

que pena

que nos paraísos fiscais

contas secretas escondam e protejam

os crimes dos impunes senhores do mundo

que pena

que o planeta procure alertar-nos

mas continuamos inebriados com nossas conquistas

e não enxergamos que nos sufocamos

que pena

que a tolice seja tão honesta e ridícula

e a inteligência tão desleal e sagaz

que pena

que o medo e a frouxidão das vítimas

desacredite a verdade

perante tanta iniquidade

que pena

que os eleitos representantes do povo

na casa do povo votem secreto

que pena

que o país das bênçãos naturais

tanto sofra com os desatinos de sua gente

que pena

que a civilização de tantas penas

torpe de euforia

não tenha de si mesma

nenhuma lúcida pena

Publicado no livro "poemas em tempos de penas" (2016).