INFÂNCIA ROUBADA

Ela brincava nas tardes

Livre a correr pelos parques

Tenra flor ainda em botão

Cabelos soltos ao vento

Sorriso estampado no rosto

Um mundo de possibilidades ao alcance das mãos.

Seu jeito brejeiro de menina faceira

Chamava a atenção

Uns a admiravam

Outros a cobiçavam

E ela inocente não sabia o que dizer

Alguém lhe disse: deixe de tolice

Você é tão linda! Não há o que temer.

Ela bem queria falar

Contar para alguém; se aconselhar

Mas a mãe estava ocupada

O pai na cadeia

A mãe desesperada

Eram tantos filhos pra criar.

“você é a mais velha

De uma fileira

Chega de brincadeira

Tá na hora de criar ideia

Você precisa colaborar.

Hoje você não vai para a escola

Vai para a rua pedir esmola

Precisamos comprar leite e pão."

E lá se foi a menina pra rua

Com o corpo malvestido e a alma nua

Onde alguém lhe dizia: “E então?

Resolveu aceitar minha oferta?

Pode crer, é a coisa mais certa

Vou te apresentar uns amigos bacanas

Que vão resolver teu problema de grana

Você só precisa prestar uns favores

Afinal, nem tudo na vida são flores".

Resignada ao destino, perdeu a dignidade

Perdeu muito mais, perdeu a identidade

Já não é mais menina, ainda não é mulher

Perdeu a inocência em uma esquina qualquer

Seus sonhos desfolhados pelos becos da vida

Se transformaram em pedras, espinhos feridas

A mãe vê a menina pra casa voltar

Com o corpo marcado a alma doída

Mas a refeição do dia está garantida

O resto é bobagem, ela há de superar.

CLAUDIA DALPIAZ
Enviado por CLAUDIA DALPIAZ em 10/09/2018
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