Os Fantasmas dos Semáforos
“... E há tempos
Nem os santos têm ao certo
A medida da maldade
E há tempos são os jovens
Que adoecem
E há tempos
O encanto está ausente
E há ferrugem nos sorrisos
Só o acaso estende os braços
A quem procura
Abrigo e proteção...
Meu amor!
Disciplina é liberdade
Compaixão é fortaleza
Ter bondade é ter coragem...”
(Renato Russo)
Eles estão lá, são invisíveis aos olhos insensíveis.
Pés sujos, roupas amarrotadas, olhos sem brilho, sem alegria.
Estão a limpar os vidros dos veículos que abrigam criaturas indiferentes, inconscientes.
Os motoristas ocupados não enxergam os fantasmas que caminham do seu lado, não enxergam seus rostos.
Estão por demais apressados, por demais conformados e já não se comovem com esse drama deprimente, indecente.
Crianças e adolescentes mendigando nos semáforos como se não fossem gente.
Todos nós estamos dormentes.
Ninguém olha em seus olhos, ninguém percebe aquela dor.
A dor de ser excluído, marginalizado, de não reconhecer em si nenhum valor.
É triste parecer invisível num mundo insensível onde quase ninguém se lembra do amor.
Os fantasmas só se tornam gente quando por algum ato inconsequente, tentam tomar de volta o que o egoísmo lhes furtou.
Quando o crime acontece, o fantasma aparece, por alguns instantes são vistos, para em momento posterior desaparecerem novamente em reformatórios de horror.
Segue a população fantasma sustentada por criaturas sem alma, que não possuem calma para refletir que estão vivendo em profundo torpor.