Reza preta
Vejo negros em negras profissões
Por detrás de negros balcões
À mercê de negros aventais
E negras ordens imorais
Por onde meus olhos repousam negros,
Sinto a velha negra diferença em ser preto
Conto inúmeros sorrisos ricos amontoados
Incomodando minha negra auto estima em cacos
O ódio desse escárnio
E o sangue negro em meus traços
Me faz versar lamúrias e lágrimas solene
Em memória de quem acorrentado aqui esteve
Em lugares aonde a segurança anda à pé
Avisto negritude apenas nas xícaras de café
Em bairro onde predomina a cor de açucar
Somos invisíveis feito borra escorrendo pela chuva
Sou o resultado da guerra que me cerca
Do arame, do fuzil e da cerca
Soldado se um reino em chamas
Soldado do morro, um preto que o céu arranha
Incontáveis palavras despencam da mente
Buscando refúgio nesse coração quente
Herói de um povo negro
Escravo de ri e de seus próprios medos
Ainda transito atento
Pela cidade cinza-cimento
Trago no peito, vielas
E o meu amor por Mandela
Dos meus, que eu seja guia
Numa mão, punho cerrado, na outra, alforria
Que não me falte o batuque
E que os deuses me escutem
Refazendo minha prece preta:
Pai, seja feita a tua vontade estreita
Não nos deixe cair em brancas mãos
E se os ignorarmos, livre-nos do seu perdão.
Amém.
Dario Vasconcelos