Mané
(Para Carlos Drummond de Andrade)
E agora, Mané?
o gás acabou,
a luz se cortou,
o prefeito sumiu,
o menino chorou,
e agora, Mané?
e agora, você?
você que tem fome,
não tem pão com ovo,
vive num inferno,
num vão de favela,
e agora, Mané?
Está sem sua fé,
em trapos imundos,
não vê um caminho,
já não pode comer,
já não pode sonhar,
não tem água no pote,
o armário secou,
não há nenhum meio,
o negócio tá feio
morreu a alegria
e tudo findou
e tudo ruiu
e tudo esgotou,
e agora, Mané?
E agora, Mané?
sua pouca mamata,
seu pequeno casebre,
seu copo de rum,
sua motocicleta,
seu salário que é pouco,
seu chapéu já puído,
sua vil inocência,
sem pódios — e agora?
Sem diploma na mão,
quer abri a porta,
mas não teve escola;
quer se aposentar,
mas o estado não deixou;
Quer ir para cima,
mas só anda pra trás.
Mané, e agora?
Se você lutasse,
Se você se mexesse,
Se você mostrasse
a voz da sua gente,
se você rugisse,
se você marchasse,
se você se erguesse...
Mas você não se ergue,
você é conformado, Mané!
Sozinho em seu mundo
qual um favelado,
em uma periferia,
um bicho de rua
que vive a labutar,
sem digno emprego
que mude sua sorte.
você sofre, Mané!
Mané, até quando?