Zé do lixo

Era um pobre menino de nascença.
Teve que trabalhar na tenra idade,
ganhando o pão, no lixo da cidade,
a rezar dia e noite a sua crença.

Jamais foi de viver de caridade,
tampouco delinquiu, mesmo com fome.
Foi aprender a ler o próprio nome
já no calor viril da puberdade.

Aos quinze, alguém lhe deu o cognome,
que carrega nos ombros desde então.
Aos vinte veio a pecha de ladrão,
sem nunca ter roubado o que consome.

Foi preso por engano e, na prisão,
aprendeu, na cartilha dos detentos,
recitar, ao sabor dos novos ventos,
qualquer coisa que rime com ladrão.

Plantou nas ruas uma nova crença
e arrebatou milhões de Zé-do-lixo.
Hoje ele ostenta um novo crucifixo,
carpido na prisão: a renascença!

Há, neste vasto mundo, alguém que pensa,
que Zé-do-lixo é coisa natural...
Há quem diga que é lixo social,
que fez por merecer sua sentença.

Hoje cedo saiu na grande imprensa,
numa manchete em letras garrafais,
os seus antecedentes criminais...
inclusive a pobreza de nascença.
 
Herculano Alencar
Enviado por Herculano Alencar em 15/11/2016
Reeditado em 03/07/2020
Código do texto: T5824173
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