Contramaré

Macapá, 11 de novembro de 2016.

Depois do trocado

A senhora pensou

"Que eu faço mesmo aqui?

Viver de esmolado?"

Pensou na sarjeta

E no cara que apontou

Pra sua filha

Pra sua neta

Ó cidade braba

Que aos pobres maltrata

Carapanãzada

Depois da enchente

Tanto lixo nos seus pés

Pouca renda nada

Deseja voltar

Pro riacho doce

Pro frescor da tarde

Para o velho lar

Não encontrou aqui

O motivo de sempre sorrir

"Mas será que volto?"

Vão dizer que vergonha

Tu não és tão assim forte

"Mas será que volto?"

A coragem perceber

Que ao voltar tu possas ter sorte

Quase levou tiro

Lhe levaram a bolsa

Matagal um cemitério

Sabe a quem refiro?

Vai calar a boca

Vai calar a alma

Ver netinha

Nessa vida louca

Ó criança inocente

Será que um dia a gente vira gente?

"Mas será que volto?

Pra enchente que um dia

Encheu os meus sonhos?"

"Mas será que volto?

Borboleta e açaí

Para uns dentes risonhos"

E bateu umas palmas

Na cabeça da ponte

Vieram ali pessoas

Vieram assim tão calmas

"Nos deram abraços

Recebemos afeto

E a netinha

Amarrou meus laços"

Andou de canoa

Disse "ó vó, mas que vida boa!"

E bateu palminhas

Vó bateu palminhas

Sua filha bateu palminhas

Todas bateram palminhas