NA ESTEIRA DE BRECHT * Perguntas de um cidadão vulgar
Quem enlutou Granada, a cidade amada do poeta?
Nos livros, todos lavam as mãos, como Pilatos.
Quem e onde foi sepultado o poeta e com ele o feitiço da Poesia?
Os livros nada dizem e eu não posso ir chorar no seu túmulo ensanguentado.
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Badajoz tem uma praça de touros assombrada.
Quem entregou os patriotas vencidos ao pelotão de fuzilamento dos fascistas?
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Era dia de mercado em Guernica, a vila basca.
Em nome de que causa aviões lançam bombas sobre mulheres e crianças?
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Espanha ficou viúva.
Onde estavam os autoproclamados arautos da liberdade dos povos?
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Depois da carnificina, o carniceiro recebeu felicitações pela vitória.
Que vitória?
Quem felicitou?
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O povo de Espanha em vão pediu auxílio a Paris.
A neutralidade cúmplice impôs a sua lei e Espanha ficou sozinha.
Um ano depois, os nazis desfilavam em Paris.
A neutralidade serve-se fria.
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Quando a besta caiu, cantaram loas à liberdade,
mas nenhuma das vítimas caídas cantou.
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Quando o Arbenz caiu, a Nicarágua caiu com ele.
O católico Arbenz foi claro: a Nicarágua está muito longe de Deus
e muito perto dos estados Unidos da América.
Acta da Assembleia Geral da ONU regista. Quem sabe disto?
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1973. Chove em Santiago!
Allende caiu em 11 de Setembro.
Hoje, os jornais não dizem nada.
Hoje, as rádios não dizem nada
Hoje, as televisões não dizem nada
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O terrorismo é uma chaga.
O terrorismo de estado é uma chaga.
6 de Agosto de 1945, adeus Hiroshima!
9 de Agosto de 1945, adeus Nagazaki!
Mais de quinhentas mil vítimas. Barbaridade? Não, foi a guerra…
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2001, o terrorismo afronta o Tio Sam.
Três mil vítimas indefesas. Paz à sua alma!
E os jornais escrevem, chorosos.
E as rádios falam, chorosas.
E as televisões, chorosas, dão imagens da barbárie.
Por que são choradas apenas algumas das vítimas da barbárie?
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Tantas perguntas sem resposta!
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José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 11 de Setembro de 2016.