Poema de Miserê
Deixo, os amargos d'alma
secando ao sol
Um breve adeus
Roupas estendidas no varal
Há um pouco de mim
em cada vento que parte
Na brancura dos lençóis
que ponho a quarar
Em cada criança que passa
pela estrada de terra batida
junto, desta esperança vermelha
que se levanta do chão
Enquanto elas brincam juntas
rodopiando nestes redemoinhos
Sobre o fogão, a fissura cozida
e um pouco de feijão
Um pouco de água barrenta
Um cachorro que quase não ladra
Há muito de mim nesta paisagem
Aridez, sede, fome...silêncio
Nos sulcos, que o lamento deixou
Em meu rosto...
nem chuva, nem lágrimas
Resta-nos, esqueléticos sonhos
Ressequido gado, sobre a terra castigada
Onde deixo, os amargos d'alma, secando ao sol
Há um pouco de mim, nesta paisagem