O quadro

Entra ano, sai ano, nesta sala

Uma alma em quatro corpos se abriga

Primaveras, verões, outonos passam

E invernos conservam a intriga

Márcia, à janela, espera pela pizza

Fugindo de ideias amorosas

Toda livre, sem frutos, sem raiz

Solidão que parece um mar de rosas

Refeição, telefonemas, TV

Chega a temida hora de sonhar

Esse opaco em seus olhos bem conheço

Sua alma carrega o meu penar

Nasce o sol e Laura confere o clima

A pensar nas roupas que vai usar

Serve cafés, mamadeiras e colo

Para sair, arruma todo o lar

Está sempre cansada e resmungona

A família tenta não opinar

Para manterem tudo funcionando

Pobre mulher... Comigo também faz par

Parece ser fácil para Maria

Submissa, lhe cabe cuidar e amar

À noite, apenas se faz bonita

Proibida de pensar e de sonhar

Mas sonha, pois isso não se controla

Apesar de aparentar santidade

Espelha minha alma reprimida

Imita meus sonhos de liberdade

Eu, Felipa, vivi nesta mesma casa

Com paixões, com medos e com amor

Diferença? Não havia opções

Rebeldia geraria terror

Nascem, morrem, renascem gerações

A batalha da mulher é sempre igual

Observo deste quadro na parede

Mesmo morta, ainda me sinto mal.

Verônica Marzullo de Brito
Enviado por Verônica Marzullo de Brito em 29/03/2016
Código do texto: T5589050
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