FEVEREIRO
Luís, magro, pardo, alto,
Inculca-se escravo da poesia.
De fala pausada, finge-se de louco.
Anda fugido desde dia três próximo.
Tem todos os dentes da frente,
Sendo um quase por cima do outro.
Possui signaes de nascença no ventre
E peito, onde traz guia azul e branca.
Signaes de vivença no olho e joelho direitos.
Levava vestido calça e camisa
De algodão da Bahia.
Não renunciou ao mulatismo, cabra de cor,
Herança da Costa da Mina, da Guiné,
De Moçambique, da Angola, do Congo...
- Cem avós.
De ofício na cata, na lavra
Auscultando ou carreando palavras.
Gratifica-se convenientemente:
Mil contos de réis por informações
Ou pistas de seus versos.
Mil poemas reais para quem o aprehender.
Tem modos humildes e atraentes,
Mas muito pachola e ladino.
É dado ao vício das artes.
Também gosta de batuque.
Suspeita-se que por seducção
Uma negra tenha-o acoitado.
Protesta-se na forma da lei
Se assim ou igual o for.
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Publicado em Cadernos Negros 37,Quilombhoje, São Paulo,2014
Página 158.