A moça

Era moça — disseram

Tinha medo

Muitos medos — disseram

Era pura

Muito pura — disseram

E um defeito

Seu defeito era o medo de ser pura

Era bela — disseram

Tinha tudo

Mais que todas — disseram

Era toda

Muito tola — disseram

No seu mundo

E o mundo a tentou a noite toda

Era tempo — disseram

Tinha gula

Mais que outras — disseram

Era tempo

Mas nem tanto — disseram

Era pura

Mesmo pura ela quis a todo tempo

Nós queremos — disseram

Seja nossa

Mais um pouco. Ela disse

Também quero

Novamente — disseram

E a moça

Se vocês inda querem também quero

Já foi moça — disseram

Seu defeito

Foi o mundo — disseram

Perdeu tudo

Não fui eu — desdisseram

Foi tão cedo

Ela mesma é que quis provar de tudo

Já não moça, mulher lembra de coisas

E soluça, pois quer

Ser já não era

Não queremos — repetem

Não és moça!

Mas existo! — por último dissera

Já foi bela — desprezam

Teve tudo

E também perdeu tudo como poucas

Foi o mundo — repetem

Foi o mundo

E ela é hoje mais uma entre as outras...

Itapecerica da Serra-SP, 18 de maio de 1995 – 22h17min