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O locutor de rádio

Na solitária madrugada da cidade,
a voz grave de veludo do locutor
anuncia o programa das almas na solidão.
Esta é a noite, ele proclama com vaidade:
Você que sofre, venha expor sua aflição,
pegue o telefone e revele sua dor!
Logo, logo, alguém chama da Liberdade.
Preso a alguém por anos a fio, um coração,
agora abandonado, pede por ajuda.
O que faço, o que faço, ele partiu!
O mágico homem do rádio não vacila.
Com firmeza, anuncia a voz graúda:
Esqueça o ingrato: logo, um novo amor,
melhor, mais sincero, vai brilhar em sua vida!
Como um bálsamo, sua palavra a dor mitiga.
Agora chama alguém de São Miguel.
Soluçando, conta sua grande aflição:
O noivo amado a traiu com sua amiga,
meu Deus, meu Deus, que papel!.
E agora, meu Deus, que vai ser de mim?
O locutor responde com decisão exemplar:
Este safado merece castigo sim!
outro homem, de verdade, já está por aí.
É só olhar para a frente, ele vai chegar!
O mesmo se deu com a moça do Cambuci.
Como num milagre, ele faz cessar o pranto.
E assim, de bairro em bairro, um grito, uma dor.
Sobre todas mágoas ele coloca um manto.
Dentro do estúdio, porém, o famoso locutor,
dá muitas gargalhadas, se diverte com requinte.
Para ele, tudo aquilo é uma grande piada!
Fala frases decoradas para cada ouvinte,
indiferente a sua dor, a seu clamor.
Recebe cada chamada, e com paciência,
junta todas elas, com cínico primor:
Tudo que deseja é aumentar a audiência.

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O poema acima não faz parte do livro abaixo

Essa vida da gente
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 Unidos 

 
Flávio Cruz
Enviado por Flávio Cruz em 04/07/2015
Código do texto: T5299278
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