TRÊS SEGUNDOS
Foi só o tempo necessário: três segundos!
Ele decerto estava ali depois da vida
Se é que o seu tempo lhe permitiu viver.
Parecia existir num tempo repetitivo, algo robótico.
Não falo em simples existência
Versejo apenas seu sopro de vida,
O de Direito.
Naquela pracinha mal cuidada
Duma vitalidade apagada
Ali tudo lhe era análogo a nós:
O mato crescia mais que barba
E ainda pude notar a sua por fazer,
Em meio à canície generalizada,
Dos pelos e da vida...e dos porquês.
Concretamente
Era ele um personagem que encenava
E ensinava empedernido:
"Com o tempo tudo desbota".
É preciso se render ao tempo
Mas só depois de se fazer o tempo render vida.
Descalço de sonhos vividos
e de projetos sequer concebidos
Mostrava seus pés enrugados
escapados da sandália maltrapilha de plástico reciclável.
Aprendera em alguns lixos desprezados
-mas já havia esquecido-
Que ainda se pode encontrar algum conforto...
Para as tantas caminhadas inertes.
Ele perdia seu olhar apático para as nuvens
Que se iam lentas, num horizonte cinza
Parecia um pensador...
Dentre tantos barracos repintados
A ancorar com seus dedos paralisados
As pontas dos arranhacéus do inatingível.
Apatia, anestesia, letargia, afasia, agnosia, apraxia.
Mas quem ousaria atestar que ali vida não mais havia?
Foram apenas três segundos entre ele e eu
Suficientes para, no meu retrovisor,
Nos perdermos juntos em pensamentos
íntimos e indecifráveis!
Aqueles que apenas o silêncio os acata e compreende.
Ali, naquela pracinha do jogo de xadrez sobre a mesa
De concreto surrealista
O jogo é apenas um: todos os peões caem
aos pés do xeque- mate do tempo perdido
estrategicamente vencidos pelos reis do nada.
Apatia, anestesia, letargia, afasia, agnosia, apraxia.
Mas quem ousaria atestar que ali vida não mais havia?
Foram só três segundos
Entre ele e eu.
Três segundos rápidos e eternos como a vida...
Me foram o bastante
para que a poesia gritasse
de dentro de mim.
A atestar que os versos que se vive
-mesmo mortos!-
Sobrevivem gritantes a todos os tempos.