O contato
Feito um talentoso malabarista,
equilibrando-se sobre
as rochas da camboa,
balaio nas costas,
lança na mão
para apanhar
os frutos do mar-baía,
espetando peixes,
coletando siris e camarões
--a água embaixo
e o céu azul em cima--,
o índio tupinambá
da tribo morubira
assusta-se quando
ouve os tuntuns...
Na direção dos sons,
dos porretes nas porradas
dadas nas sapopemas,
Guataçara, como flecha,
disparou ajudar o parente...
Pois algo de ruim sucedeu
com este um irmão índio
em praia próxima dali,
rumo onde o sol se levanta,
lá pela boca do Igarapé Carananduba...
O parente não flechou o peixe,
foi flechado pela arraia
--o beiju hostil do fundo do rio.
Uma única lágrima doída,
porém nenhum gemido ouvido
ali naquela plaga, paisagem
onde a areia clara e a luz
foram morar,
filhas do Céu e da Terra
(pai e mãe amorosos)
que resolveram procriar
na Ilha do Moqueio...
Os que deveriam ser evitados,
donos do fogo pequeno,
rodeiam o irmão, parecem cuidar dele,
aquele povo estranho,
de corpo todo coberto por panos.
Crianças, jovens, mulheres, homens,
um com traje cor da noite,
cabeça raspada no cocuruto:
era o xamã dos estranhos...
Dois o levam, sustentando-o nos ombros.
Vão indo para o descampado,
lá onde habitam estes que se vestem.
Onde subiram a torre,
alta como uma siriúba,
o templo do deus deles...
Guataçara não fugiu.
Testemunhou e narrou para a tribo
tudo o que viu acontecer
ao irmão Guayí.
Três luas se passaram,
e Guayí voltou à taba
dos parentes Morubiras,
trazendo o corpo todo coberto
de panos escuros, colar no peito,
com dois paus cruzados:
estranho adorno...
Mas nada de cocar...
Trazia caixinha preta na mão,
dentro dela desenhadas aquilo
que disse ser as palavras do deus
dos que não são Morubiras.
Trouxe pequenos cacarecos
que entregou para as crianças...
No meio, pauzinhos cruzados
para pendurar no pescoço...
O fim estava se aproximando...