Lar de Pedra

Acumulados debaixo do concreto

Quietos, cada vez mais nos cercamos de cimento

Onde, apressados, construímos esbaforidos

A prisão mais segura para os nossos desejos

Mas, nos sentimos tão libertos e orgulhosos nesse espaço

Tão restrito, tão completo, tão tranquilo e isolado

No qual nos aquecemos e sufocamos, comprimidos

Sob a aglomerante camada de cimento impenetrável

Aí pairamos tal como num sonho enrijecido

Ali parados naquele cristalizado realismo

E, assim, como se também de concreto, petrificados

Remodelamos pouco a pouco o nosso espírito

Com o tempo, até o corpo ao concreto vai-se fundindo

Derrete-se a própria alma para lacrá-la nesse invólucro

A emoção e o raciocínio a matéria-prima reduzidos

Para caberem minimizados nesse minúsculo abrigo

E ali morremos do concreto armado prisioneiros

Sepultados e acoplados à grande massa de cerâmicos insumos

Na qual nascemos, derretemos, enrijecemos e formamos

O inerte material bruto que deformará nossos herdeiros

Então, nos reformaremos desses restos de espírito humano

E nos reconstruiremos n’outros rostos, n’outros nós mesmos

Cada vez mais frios, mais rijos, mais quebradiços... Macilentos

Reaplicados na caseira usina de pedra e entulho organizado

Onde nos repetiremos e nos repartiremos em mil pedaços isolados

E outra vez nos reciclaremos e renasceremos de cada um desses ovos

Cada vez mais chocos e cada vez mais fragmentados

Remodelando o doméstico cubículo com farelos de nós mesmos

E, de tão deformados e reduzidos pela inevitável ação do tempo

De nós restará apenas a poeira e a escória de algo embrutecido

Todos meros reciclados resíduos reciclados de nós mesmos

A matéria-prima de seres cada vez mais autômatos...

... Mais desumanos

Demofobo Santos
Enviado por Demofobo Santos em 25/08/2014
Reeditado em 25/03/2015
Código do texto: T4936168
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