JUÁ (Àqueles que morrem por falta de terra)

“Vejam que sina, esta minha:

Nasci pra cuidar da terra

Mas, me expliquem, não entendo

O presente que me encerra

Tenho sete filhos novos

Somos nove esfomeados

E a terra? Eu lhes pergunto:

Onde está o meu roçado?

Não me deram minha parte

Desta herança de Adão

E sei que não sou o único

Muitos sei que, como eu, estão

Penso: será isto um castigo?

Mas, qual foi o meu pecado?

Nascer pobre, maltrapilho?

Sem ter ouro, terra ou gado?

Não nasci por que pedi

Nem vivo, só sobrevivo

Não sei como me agüento

Como da morte me esquivo

Não desejo muita coisa

Sei que não tenho ambição

Mas, quero dignidade:

Terra minha, água e pão

E os coitados dos meus filhos

Como eu, nascem condenados

A não sermos mais que peles,

Ossos e sangue esfomeados

Quem deveria defender-me

Muitas vezes, me explora

Dizendo, talvez, no céu

‘Um dia chegue a minha hora’

Se Cristo salvou o mundo

Eu não salvo a mim mesmo

Ele teve um penar profundo

E eu vou vivendo a esmo

Onde estão seus seguidores

Os que adoram sua cruz?

Deviam fazer o mesmo

Ao mundo levar a luz

Mas, qual nada, não interessa

Imitar o Mártir da Cruz

Vão rezando o terço e dizendo:

‘Muito mais sofreu Jesus’!

Eles esquecem que Cristo

Mora aqui do nosso lado

E que eu também sou um Cristo

Pela fome crucificado

Esta fé que se professa

Sem fazer transformação

Vale tanto quanto a terra

Que, sem água, vira torrão

Pra completar esta história

Este meu clamor profundo:

Muitos, que me desconhecem,

A mim chamam de vagabundo

Eu que nasci pro trabalho

Tenho um presente indigesto

Igualzinho ao meu passado

Meu futuro? É muito incerto!

Diga a mim o que eu faço

Pra mudar o meu destino

Pra realizar os sonhos

Que trago desde menino