Chega de produto A e leite C

Chega de elitizar

separar escolher tolher

selecionar os melhores os tais

celebridades

criar prateleiras

produto A leite C

os que lêem e os que vivem

os livres e os neoescravos

é preciso misturar joio e trigo

mudar sentidos

inverter estatísticas

dados

inverter a mão

contramão contradição

antídoto e veneno

calmaria é prenuncio de tempestade

não me engano

não há paz sem correr riscos

dedo na ferida

sal na doce vida da elite

Chega de condenar o povo

à eterna espera

o menor à culpa por tudo

pelo crime pela morte pela sua sorte

sem trabalho sem suporte

a mulher à cozinha afazeres e rezas

dificultar o acesso

ao estudo à moradia à saúde

remar na contracorrente

é o que resta

e o que o Brasil oferece:

medo

desprezo

roubo

ou resistência paciência parcimônia

enquanto o governo ajusta

a economia

faz o superávit

nomeia seus cupinchas

enquanto no alto come-se o bolo nos faz tolos

eternos cordeiros

não tem acordo

ando sozinho no escuro

não me conformo

me estranho as vezes sou insano

desentendo desse lógica

esse descompasso

parece sem saída essa avenida

essa ferida não se fecha

não me desmobilizo

não me iludo: tudo ainda é igual a ontem

ao desigual de sempre

sigo reto nesse caminho torto

não me vendo não me vedo não calo