Consumindo medos
Consumindo medos
Guida Linhares
Acordo e me espreguiço;
agradeço a Deus um novo dia.
Abro a janela,
o sol esquenta a manhã,
num convite ao passeio.
Saio com pensamentos leves,
paro diante da banca de jornais.
Meus olhos vêem manchetes
violência, sangue, mortes.
Saio angustiada no pensar
a quantos riscos nos expomos
a qualquer hora do dia e da noite.
Minha atenção se volta agora
para as flores do jardim da praia
e sinto meus olhos marejarem
por sentir a tristeza assolar.
Porque vivemos num mundo
com tantas riquezas,
mas o bicho homem está cada vez
mais irracional?
Porque a violência cresce
a olhos nús e vai deixando
rastros de infelicidade?
Até quando teremos isto?
Até quando a agressividade
continuará imperando e vitimando.
O que poderíamos fazer
para tentar minimizar
tal estado de coisas?
Nos sentimos consumidos pelos medos,
nosso andar se torna pesado e vagaroso,
os olhos fitam o chão e nem mesmo o sol
nos desperta deste estado letárgico.
Mas um menino se aproxima e paralizamos
quando ele nos fala: estou com fome!
Na mão apertamos a bolsa
e saimos correndo, quando deveríamos
ao menos olhar a extrema carência
e tentar fazer alguma coisa:
talvez fosse a nossa oportunidade
de ajudar a reduzir a
escalada para a violência futura.
Pela falta de amor e por tantas
outras carências sociais,
cresce a fera violenta e sanguinária,
semente do individualismo e
do capitalismo selvagem.
Santos/SP
24/04/07
Participação na ciranda Consumidores do Medo dos nossos queridos amigos poetas Victor Jerónimo e Mercêdes Pordeus.
CONSUMIDORES DO MEDO
CIRANDA
Você é um consumidor do medo? O caso gravíssimo de uma criança que foi arrastada por alguns quilómetros no Rio de Janeiro veio aumentar ainda mais a insegurança dos cidadãos brasileiros. Em horas destas todas as pessoas se horrorizam com o acontecido.
À insegurança impõe-se o isolamento pelo medo e as pessoas trancam-se em casa, põem barras nas janelas são consumidoras do medo.
É perigoso andar de carro durante a noite é perigoso circular a pé durante o dia.
As cidades perderam a sua função e os recursos públicos são quase inexistentes.
A ceifa da vida quase que se tornou banal e se os horrores de uma noticia hoje levantam gritos e clamores, amanhã tudo está esquecido por sobreposição de outros horrores ou porque a habituação nos leva a isso.
Na grande maioria dos países desde o rico ao pobre a "violência urbana" ceifa cada dia mais vidas e leva o homem ao isolamento total, deixando de haver aquele dialogo de revolta que antes unia populações em torno de um objectivo comum.
Os governos cada dia se mostram mais impotentes para lidar com este flagelo.
Os muitos estudos ou soluções apresentados caem por terra porque se mostram incapazes quando em actuação no terreno.
E nós transformamo-nos rapidamente em consumidores do medo. Passamos a vegetar.
Já não podemos bater aquele papo com amigos no café ou ficarmos simplesmente sentados num jardim a admirar a natureza, porque o óbvio nos assusta e até porque muitos foram encerrados com grades tal é o perigo.
CONSUMIDORES DO MEDO, pretende ser uma ciranda que brote do fundo da nossa alma o nosso grito, não de medo mas de revolta.
A revolta pelo que assistimos no dia-a-dia, a revolta porque sendo cidadãos livres de pleno direito, vivemos enclausurados, a revolta porque ninguém consegue chegar a uma solução que minimize o mal que grassa nas nossas cidades.
Seja você cidadão brasileiro ou português, viva no Brasil, em Portugal ou em qualquer outro país, envie-nos o seu grito, O GRITO DE UM CONSUMIDOR DO MEDO.
Victor Jerónimo
Mercêdes Pordeus.