SURTO DO VERMELHO AO BRANCO
Juliana Valis



Chegou a hora de se vacinar

Contra o susto, o surto que se espalha !

É preciso, agora, não dissimular

Esconder o vírus da doença sempre falha !



Cidades inteiras, pegas de surpresa,

Raptadas, seqüestradas num relâmpago,

Projéteis disparados ao relento

Nem os postes da cidade estão ilesos,



Revólveres desfilam sempre pelas ruas,

Paralíticos como pássaros sem asas,

E as metralhadoras, levianas, posam nuas,

Para as lentes de uma violência em brasas,

Como chamas que queimaram nossas luas

Como lamas nas prisões de nossas casas...



Grades se erguem, onipotentes,

Mas o lapso da riqueza, a exclusão,

Nenhum muro de concreto vai e barra,

Como aurora dos dias que não vão.



Anacrônicas armas policiam os quartéis

Metralhando muitos cacos de poder,

Vidro que é blindado, e se estraçalha,

Labirinto que se sente e não se vê...





Pelotões são tão frágeis quanto plumas

Soldados são de cristal, e não de chumbo,

Pois digamos logo que nada disso nos agrada

Digamos, sim, que nós queremos outro mundo



Vacinemo-nos, pois, com toda a calma,

Contra a pior doença que existe e existiu,

A doença que avermelha a cor da alma

Como telha de um amor que sucumbiu



Então paremos de nos vender tais como armas

Que derramam sempre sangue tão insano,

Paremos de humanizar as escopetas,

Antes que elas desumanizem, fatalmente,

Aquilo que ainda temos de humano.