A EPOPÉIA DO NORDESTE
A EPOPÉIA DO NORDESTE
_Inverno
Foi pouco
O pobre
Caboclo
Guardou
Na sacada
A velha
Enxada
Que não
Vale nada
Sem chuva
No chão.
Espera
Cioso
O inverno
De novo
Pra fazer
Sua cova
E plantar o feijão.
Enquanto
Espera
Vai comendo
Lagarto
Que também
Não é farto
Pois não tem
O inseto
Pra ele comer.
A fogo-pagou
De sede
Morreu
Lá no riacho
Sobre a areia
Fininha
Pobre rolinha
Voou tanto, tanto
E nem as filhinhas
Pode salvar.
Hoje quem morre é o povo,
Todo esquelético
Parecendo morfético,
Perdeu suas carnes
Quem comeu foi a fome
Não parece mais "home",
Como pinto no ovo
Morre sem respirar.
Triste sina maldita
Viver na desdita
Sem poder campear,
Morreu seu gado, galinha,
Ficou sem nada que tinha
Sem um naco de pão
Mulher e meninos
Chorando em vão.
Ah, tem o bolsa família,
Bolsa escola também,
Governo bondoso
Não morre ninguém
Tudo é classe média
Não existe miséria
No meio deste sertão.
Mas ande na estrada
Fortaleza a CaNINDÉ
Veja meninos, mulher,
Homens de mão estirada
Ao longo da estrada
Com água nos "óios"
Parecendo gravetos
Iguais aos espetos
Do rico que tem milhão
Tirado do "mensalão",
São ricos pelo dinheiro
Mas pobres de coração.
Não sei se vocês notaram
Que eu aumentei as estrofes
E os meus versos também,
Só pra mostrar uma coisa
Que o governo bem faz,
Aumentar a riqueza
Dos ricos por natureza,
E aumenta pra eles todos
Com os bancos oficiais.
É balela se dizer
Que a pobreza acabou,
A fome grassa nas terras
Por onde a peste passou,
Pois não há peste pior
Que a fome que se agravou
Neste sertão feio e morto
Que o mal já devorou.
Morre o gado, morre o pinto
Morre galinha também
E o pobre dos passarinhos
Não existe nem quém-quém
Não há água, nem um peixe,
Senhores tomem cuidado
Pois bicho ruim é fome
Pode transformar o homem
Que também pode matar
Por um prato de comida
Com sua alma esquecida
Quando a fome apertar,
Prenda a água para ele,
Para beber e pescar,
Façam açudes, barragens
Pra sede deles matar.
Voltarão os passarinhos,
O homem volta a trabalhar]
Nas vazantes dos açudes
Planta seu milho e feijão,
Não adianta doutor
É querer nos enganar.
Financia uma bela moto
Para o coitado enganar,
Moto não enche barriga
E é só pro rico explorar
O dinheiro do coitado
Que não tem para pagar
E corre atrás do seu gado
Com a moto a apitar.
Dizia Luiz Gonzaga
E com muita retidão
"Seu doutor uma esmola
A um homem que é são,
Ou lhe mata de vergonha
Ou vicia o cidadão"
E muitos estão viciados
Com toda a enganação.
Uma parte viciada
A outra com a mão no chão
Um andando de moto
Que é comprada à prestação
Não sabendo até que dia
Ela volta ao tubarão.
Cadê O São Francisco
Nossa água redenção
A seca chegou mais rápida
E estorricou o chão
E da água não escorreu
Nem um pinguinho no chão
Mas no discurso vai correr
Pois está perto a eleição.
Vou ficando por aqui
Pra ajudar meu irmão
Eu nada tenho na vida
Mas tenho bom coração
Pode ele precisar
De um pedacinho de pão.