Interrup ção
Pare de ver o pôr-do-sol
Pare com as greves gerais
Trabalhe feito porco
Engula o porto do cais
Não crie cânticos
Não passe por essa porta
Pare de sortear amores
Leia com essa mente torta
Pare com o rivotril,
a explosão antidepressiva.
Pare com as pilhas eletroquímicas
que não carregam sua energia.
Não crie anúncios
Esqueça os jornais
Não sofra aos prantos
Sua dor não caberá nesse mundo
Agora, pare!
Pare já com a luta diária
Dê um gelo no tempo
Pare com o pseudismo,
o movimento cancerígeno,
a indústria dos prazeres
Não enlouqueça!
Seu coração vagabundo está atrofiado
Num paradoxo de sentimento opaco
Não vá dirigir teu carro
De desdobramentos inconstantes
Freie no acostamento
Não respire gás intoxicante
Jogue merda no ventilador!
Você está fechado na sua cela
Pare com a conversa violenta
Estampe suas víceras na mazela
Não veja!
Por favor, não veja o mundo lá fora.
Lá é só faticidade;
A fome e o frio não passam,
E você é todo frescura e permeabilidade.
Deixe as dentaduras múltiplas!
Não beba essa taça
Pare de morrer pela rua
quando anda em descompasso.
Vai, pare!
Pare com os motins!
Mudança na nossa conjuntura?
Não quebre as estruturas,
Não fique com a cara de tacho.
Pare de depilar sua angústia por inteiro
Não grite, é exagero
Não deite de cansaço.
Seu moço, o mundo é fudido.
Impotentemente incompetente.
Vira rotina
o absurdo!
Nada se ensina para um mundo
Retardado em substantivos.
Parado o bipolarismo,
a fotossensibilidade
Fuja da crise!
Vá se esconder na sua vaidade.
Meu sobrenome é caduco
Eu não sei mudá-lo
Veja só as minhas lentes
que não fazem nenhum contato.
Então, parei.
Não sigo caminho algum.
Já fazem 500 anos que
deixou de existir o passado.
Agora pare para pensar
se esse poema não está só cansado.