Selvageria
Sinto ferver todo o sangue
se vejo estendido no chão
um homem sem teto e sem pão
e passar por ele o patrão
que “ficou rico por mérito seu”.
Qual seria então, eu pergunto,
o mérito do pobre de berço?
Qual seria sua culpa, no fundo?
A de não ter nascido rico
o azar de não ser herdeiro
a desgraça de não ter terras
e de não explorar ninguém?!
É por isso, só pode!, só isso!
que o pobre não ganha um vintém!
Não é dado ao acaso,
que o sonho de tantos coitados
que vivem na lama jogados
é um dia ser o patrão:
não de si mesmo
mas do próximo!
Essa ideia vendida e comprada
de ter o seu próprio negócio
não se trata de mais nada
além da perpetuação
do sonho da exploração:
deixar de ser o explorado
para ser o explorador.
É da humana natureza?
Que desculpa bem dada!
Jogar a culpa de forma generalizada
enraizando a crença de que
a realidade não pode ser mudada
afinal, “é do homem ser assim
é humano ser ruim”.
Sistema selvagem
prevalece a lei das matas:
é preciso correr sangue no chão
para saciar a fome ao rei
e a quem não nasceu leão:
carcaça, morte e lei.