A moça que pedia cores

Havia uma moça pedindo cores na rua.

Podia ser qualquer cor, dizia.

Podia ser cor chata, cor fria,

podia ser cor em meio-termo,

podia ser cor de calmaria,

ou cor de tempo feio.

Podia ser cor pálida, fraca,

podia ser vibrante ou sem graça.

Queria e precisava das cores;

todos tem os seus amores.

Pedido negado por muitos, é claro.

Tinha gente que passava e nem olhava,

tinha gente que sorria e gente que desprezava.

Uma senhora chegou a ofendê-la;

onde já se viu, que coisa feia!

É um absurdo atrapalhar

quem caminha fora da paleta!

Cor é frescura, alguns pensavam;

"isso é distúrbio, toma um chá que passa."

Mas cá entre nós, cor é leveza condensada que não acaba.

Passou um menino bravo que deu um pouco de lilás.

A moça ficou extasiada. Que coisa inesperada!

Uma mocinha tímida quis acompanhar e

deu um pouco de cor do mar.

Foi um susto. Quanto tom! Lusco-fusco!

Um senhor sorridente contribuiu com verde,

aquele verde gostoso de relva fresca;

quase sentiu o cheiro de natureza.

Uma mulher de semblante sério quis dar

um pouco de amarelo. Dia tenso.

Seguiu dizendo que desejava boa sorte e

acabou deixando um pouco da cor do norte.

E foi assim que a moça passou o dia;

conseguiu até mais do que queria.

Durante a noite, ganhou um monte de azul e vermelho,

ganhou a cor dos cometas e dos espelhos.

Uma menininha deu a cor do medo

e o irmãozinho a cor do atrevimento.

A moça trocou um pouco de cor com eles:

deu cor de açaí, de caju e de pequi.

Um homem alto de olhos grandes

deu um monte de cor dos amantes.

Do âmbar, teve tom de apatia e de samba.

Do rosa, cor de doce, de ânsia e de prosa.

Das crianças, teve cor de areia e cor de sereia.

Quando decidiu descansar, a moça fez um intento: nada de misturar!

Essas cores vão servir pra quem tem medo do tempo.