Padeço

Padeço pela minha corrente

Padeço pela cor de minha liberdade - que se foi

Padeço pelo som da minha gente - que se foi

Padeço pelo que não mais sou

Padeço pelo soar de meu chocalho

Padeço por não ouvi-lo mais

Padeço porque me despiram de minha vida

Padeço porque alguém não sou mais

Padeço e padeço por todos os dias

Padeço e padeço em todos os cantos

Padeço triste e sem qualquer alegria

Padeço na senzala sem som e sem chão

Padeço com a minha criança que chora

Padeço por não entender a maldade

Padeço por não entender a demora de minha raiada liberdade

Padeço porque não consigo ver o dia

Padeço porque não tenho mais olhos vivos

Padeço porque não sou mais o rio comprido de minha mente

Padeço porque tiraram meu credo

Padeço por não ver mais Tupã

Padeço por Nzambi, Iemanjá, coisa de meu tempo

Padeço pelo espírito que perdi

Padeço sem restar mais vida

Padeço e padeço e padeço

Padeço por não ter mais começo

Padeço por só ter mesmo o fim

Eustáquio José.

Tato Silva
Enviado por Tato Silva em 24/05/2013
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