Protocolares

A impessoalidade do formalismo nos conduz

ao aperto formal das mãos vazias.

Apenas o vácuo abraçamos. Talvez nem nostálgicos.

Nada mais somos. Apenas fantoches

de quem o Mundo faz deboche.

A perenidade que um dia supomos, esvaiu-se na falta de tempo

das agendas repletas de vidas incompletas.

Mas estamos adestrados e trocamos beijos insipidos,

em honra aos falsos deuses límpidos.

Pessoas comportadas, civilizadas, dirão.

De rostos sérios e isentos de mistérios.

Cínicos e cônscios de nossa covardia,

participamos da elegante hipocrisia

que tudo nos tomou.

Até a antiga dor,

pelo amor que não vingou.

Mas somos pessoas elegantes que sufocam as mágoas.

E no entanto, no fundo, sabemos, como sabem quem nos classifica,

da dor que se sente e do vazio que tudo modifica

quando cada qual segue um caminho desigual.

Todos sabemos, mesmo que disfarcemos,

o quanto ficamos menores

quando os jardins deixam de ser regados

e os poemas são apagados.

Todos sabemos, mas nada dizemos.

É preciso cumprir o protocolo e seguir as formalidades.

E, sobretudo, é preciso fingir que se tem felicidade.

É imperativo que se deixe os "bites" e "bytes" devassarem

o que foi intimidade. Deixamos de ser individualidades.

É necessário plantar um cinzento edíficio

e exercer a burrice como ofício.

Entremos no "Mundo Fashion". Sejamos antenados.

Já não se deve chorar um amor fracassado.

Em breve as "Redes" irão te repor "na pista"

onde tu conhecerá quem sempre te esperou.

Enquanto não, aprendamos a dormir sem ninguém ao lado

e a despertar como um mero autômato religado.

Esqueçamos o Passado.

O protocolo é o nosso legado.