Maturescência
No tempo em que tudo se conhecia e se descobria
A gente sabia o que dizer mesmo nem sabendo do que
Dizia que não se sabia, mas que gostaria de aprender
No tempo em que correr na calçada de casa era liberdade
E que logo se acabava quando se ouvia o chamado das mães
A gente brincava lá fora de ser feliz sendo criança
E desejava o dia e a hora em que se despediria da infância
Hoje, as coisas mudam com mais força
E tudo se percebe diante do espelho e até de um vidro qualquer
Já nem se sente mais aquela euforia que guardava o ano inteiro
E aquele pavor que rondava os pensamentos quando a gente fazia algo errado
Era assim, tudo sem tempo com tempo marcado
E aos poucos ganhando tempo perdido com cada erro
Sem contar que os tombos traziam uma careta de choro
E logo se via um riso disfarçado chegando devagar
Logo em breve, se conheceria um sentimento diferente
Que fazia da gente um prisioneiro dependente de tudo
Iludia cada enfeite e cada frase ensaiada
Até que se tinha coragem de buscar viver e ter alguém
Antes, só se pensava em quanto tempo levaria até ser um adulto
Hoje, já se conta quanto tempo se vai ter pela frente
Antes, uma inocência decorada de meiguice
Hoje, uma amargura traiçoeira dos enganos alheios
Antes, a inconsequência de ser jovem
Hoje, a consciência bruta de que a juventude foge entre os dedos
No tempo em que não se sabia o que era dor
Tudo era movido a gargalhada e encrenca
Até que um dia, se sente lá no fundo faltar um pedaço de alma
E um pouco da precisão de um afago
No tempo em que tudo era descoberta
Mal se sonhava com a tal da saudade
E hoje, na frente de outros inocentes
A gente se dá conta de que tudo isso é viver...
A maturescência chegou.