MUSA DA RUA

lisieux

Seminua

barrigão à mostra,

umbigo saliente

sob a blusa

tão apertada que amassa o seio...

Bonitas pernas,

soltas, andarilhas,

apesar das cicatrizes...

feridas de que?

Dos cacos de vidro

que cobrem as ruas,

de pedras, porretes,

das surras dos pais,

ou do companheiro

- menino também-

mas que sabe bater

e que diz que aprendeu

só pra se defender?

Menina franzina

com outra menina,

coberta de panos,

que leva nos braços

e outra no bucho...

vai logo chegar.

E ainda sorri

ao pedir o “trocado”;

pra ela é pecado

até mesmo chorar.

Menina, menina...

que fazes na rua?

Devias estar

numa cama de nuvens

coberta de estrelas,

sonhando com fadas,

princesas, dragões...

Teu corpo, menina,

não é para os bancos

das praças, calçadas,

faróis, estações...

Devias sonhar,

até mesmo acordada,

os sonhos amenos

de toda menina,

mas estes... ah, não!

Não sonhos que brotam

(talvez pesadelos),

do saco com droga

que apertas na mão.

Tu és Cinderela,

porém tu não sabes.

Apenas percebes

os vultos à volta,

insultos, revolta,

casebres, favela.

Teu maior desejo

não é ser princesa,

mas ter uma vida

feliz, de novela.

Que fazes, menina,

de noite, na rua?

Teus olhos deviam

olhar para os lados

e ver o teu quarto

pintado de rosa,

cortinas azuis...

Porém tua vida

só tem duas cores:

o preto da pele,

que assina tua sina

e o branco dos homens

que exploram, menina

tua vida, teu corpo,

tua mente, trabalho.

Colorido?

Apenas a blusa

amarela que usas...

e o rosa encardido

do teu par de meias...

Ah!

E o sangue

vermelho

que corre em tuas veias…

BH - 23.01.07

Dedicado a uma garota que encontrei num sinal de trânsito nas ruas de BH.

lisieux
Enviado por lisieux em 07/02/2007
Código do texto: T372675