delicatessen sensual

andando no beco lá da favela

a negra donzela, vestido de chita

de algodão, a cara bonita

por trás do pescoço, eu adivinho

a exaltação com que a cumprimenta

o sol, ele tenta, mas ela nem liga

segue andando ou será que trotando?

parece uma égua, as coxas salientes

durinhas, pungentes, jogando peteca

com classe sensual, e a genitália

ali entre elas é como a da negra

que segue coberta (pra que eu não a veja

mas que me enseja um desejo animal)

pela calcinha sob o vestido

estou distraído e ela então pára

como num riacho e acende meu facho

de lubricidade enquanto os peixes

a reverenciam, detendo-se logo

pra ela passar, ela ou a égua

(as duas, não sei), e ela atravessa

solene o riacho, eu vou e não acho

ninguém pra falar que aquela beleza

será com certeza a única coisa

que me emociona naquele lugar

ali na favela, tirando a tela

que tem todo dia de sangue e de luto

de luta e de vida (indefesa alquimia)

que faz o pintor ensaiar sua dança

pra não ver a dor de alguma criança

e esquecer da mulata, da égua, riacho

e eu que o meu facho esqueceu de brilhar

Rio, 03/01/2007