Massa operária
I.
Ouço uma música distante,
A ecoar como da pátria um hino,
Que cantam ninfas no instante
Em que vejo uma sereia me olhar com mimo...
Mas onde estamos neste vasto mundo?
É a lua a mesma de sempre diferente,
Pois hoje ilumina com um brilho mudo,
Enquanto ontem cantava sorridente...
Este mundo em que os pássaros voam,
Mas não mais ressoam os cantos da solidão,
Esse mundo é o viver de flautas que entoam
A música da eterna imaginação...
Então por que a morte certa foge desse mundo?
Talvez porque a indesejada das gentes muito ama
A dor dos viventes seres mortais do planeta imundo.
Quem será que vejo sangrando a se banhar mudo
De suores, morrendo de calafrios, a trabalhar na cama?
É o homem devasso que morrendo de cansaço ama tudo...
Então sei que canto é aquele, pois chorando ouço o homem,
Que sofrendo o corpo encolhe, pois do seu sofrimento ri-se Satanás;
Mas as correntes humanas que prendem o homem
Não seguram os poetas que choram mais e mais...
II.
Então que homem será esse que canta, geme e ri?
Será o homem do cangaço, que bruto cavalgava
Por entre as matas que derrubar o homem quis?
Ou seria o homem que cansaço tinha porque chorava?
Mas que coro será este de vozes sofredoras que ouço na amplidão?
Será nos mares de pessoas que como tempestades vivem solidão?
Não são escravos os trabalhadores fortes, bravos, que perdem a ilusão?
Sim, são sofredores que antes crianças felizes, hoje homens e desilusão...
III.
Então sofrem as mulheres de seus corpos se venderem,
Vão às ruas e perdem-se em braços distantes,
Trabalham até crianças amantes da vadiagem por serem
Pobres sofredores como as muitas prostitutas d'antes...
Mas que honra é essa que nasce e esvai-se?
Serão mais vis os homens da morte
Ou os pobres que nos sinais esperam esquecerem-se
Das vaidades de cuja infância não previu a sorte?
Sim, sei que a tristeza é a mais dura das infelicidades,
Mas quantas emoções preenchem a vaidade
Dos poetas que amam as verdades
Que recriam sem cessar, independente da idade.
IV.
Existe uma espécie que a cultura ensina
Que somos cheios de infâmia e covardia.
Morrem pessoas de tristeza e do caixão em cima
Caem flores que um dia
Foi uma semente que se tornou vegetal,
Como uma mulher sem ter sofrido o mal
Que a vida desfere na mais mortal
Das felicidades de viver percebendo o vital...