Canção aos dias pueris
Assoviei uma canção ao ouvido da hora menina
E ela mostrou-me os espinhos e as pétalas da saudade juvenil.
As pétalas douradas agraciavam as manhãs abertas e claras.
E os espinhos furavam o coração do crepúsculo cinzento.
Uma mão esticada ao vento pedindo uma nesga de flor
Com o sangue fanado ao chão.
Esses dias já se foram. Mas ainda não acabaram.
Mãos e espinhos compartilham a mesma verdade.
A verdade sã de plantar e não poder colher perfumes coloridos.
Mas a de colher dor.
Selvagens repreensões que zuniram por aí
Quando Zumbi desnudou as vestes negras e brancas,
Quando a intenção era resgatar a virtude
Que Prometeu furtou e a espalhou entre nós como uma gota de luz.
Esses dias pueris estão espalhados na memória da “Depressa”
Espera fatigada de Agostinho Neto.
E a canção revoa nos tamborins das ladeiras
Rasgando o tímpano suicida.
Procurem pelas alpercatas. Procurem os caminhos
Que o látego traçou e encontrarão os rostos
Anônimos e pardos.
Encontrarão os monumentos que os abrigam
E servem de travessia.
Essa é a sincera equivalência contrária do contraste
Da pétala e o espinho.
E a canção ainda tamborila em nosso coração.