TENHO CULPA; TENHO MEDO!
TENHO CULPA; TENHO MEDO!
Penso nas crianças esquálidas africanas
Nas crianças sem norte, nordestinas
Nos pais ignorantes, nas sinas
Eu tenho culpa; tenho medo!
Penso nas mulheres com suas pernas abertas
Com seus olhos abertos, suas bocas abertas
Com seus sentidos fechados
Não tenho culpa; tenho medo!
Penso nos homens com suas contas cheias
Suas mentes vazias, seus sentidos tolhidos
Seus valores distorcidos
Não tenho culpa, tenho medo!
Penso nos políticos com suas idéias dissimuladas
Incapazes, corruptos, disponíveis
Néscios, falsos, insensíveis
Eu tenho culpa; tenho medo!
Penso nos índios, nos negros, nos velhos, nos fracos
Espoliados, discriminados, desassistidos
Desrespeitados e esquecidos
Eu tenho culpa; tenho medo!
Penso nos jovens, pobres sem oportunidade e instrução
Ricos sem limites e sem atenção
Estudantes sem rumo, sem noção
Eu tenho culpa; tenho medo!
Penso no povo enganado e nos seus sonhos
Em sua passividade, em sua docilidade
Em sua ingênuidade
Não tenho culpa; tenho medo!
Penso nos poetas, em seu sofrimento e decência
Em sua tristeza, em sua impotência
Em sua pureza, em sua inocência
Não tenho culpa; tenho medo!
Penso nos sábios e em sua consciente importância
Em suas teorias inertes, em sua arrogância
Em sua ignorância
Não tenho culpa; tenho medo!
Penso nos ricos e em sua egoística ambição
Em sua decadência, em sua desilusão
Em sua concupiscência
Não tenho culpa; tenho medo!
Penso na fome dos sem-teto das marquises e da periferia
Em sua sede de justiça, em sua paralisia
Em sua exploração, em sua exclusão
Eu tenho culpa; tenho medo!
Penso nas mulheres não amadas, mal amadas
Nas sem voz e abandonadas
Sufocadas, humilhadas
Não tenho culpa; tenho medo!
Penso nos homens sem trabalho, sem terra, desonrados
Em sua desintegridade, em sua indignidade
Em sua insalubridade
Eu tenho culpa; tenho medo!
Penso na humanidade e em sua idiossincrasia
Em suas crenças, preconceitos, doenças
Na pedofilia, na hipocrisia
Não tenho culpa; tenho medo!
Penso na sociedade e nos seus princípios rotos
Em sua moral dúbia, em seus mortos
Na atitude espúria, nos abortos
Eu tenho culpa; tenho medo!
Penso;
Não tenho culpa...
Penso;
Eu tenho culpa...
E tenho medo!
Então tenho culpa!
Então tenho medo!
Leopoldina, MG.