Boca suja
Atrás da porta da aparência
há a boca suja que proíbe e nega
que beija e morde e cospe
é mais saliva e desdém do que carinho.
De teu grito: a lei, um tapa na cara,
uma jaula e um falso concreto sentir de segurança.
Beija tão só os filhos pródigos, de sangue e que sangue,
que ainda sangra, são àqueles poucos, mas poderosos
demônios, personificações das misérias (e para as misérias)
arquitetos e engenheiros da desigualdade.
Enquanto aos filhos bastardos resta somente cuspe
e mordidas que aos poucos dilacera a carne e o espírito.
Então, fecha-se a porta e resta o exílio, a sentença
o medo e a lei, cujo olhar deita-se à espreita de algo.
Supõe algo, acha. Acha um meio de condenar. E condena.
E nega-se três vezes a essência da desfaçatez (não não não).
Abre a porta e veja, lá estará outros homens, cópias das cópias.
Estará, na verdade, o homem que, de fato, se alegra com os crimes,
os quais matam crianças de fome e os homens com tiros e pancadas.
Hoje ou quem sabe amanhã a boca suja te pegue e te proíba,
antes, bem antes, que alguém escute teu grito, mas restará marca
e, sobretudo, luta e sangue e vida e pedra e utopia e desejo. E [realidade, um dia.