Partes ocultas
Ah, esse nada ofídio,
todo enrolado preparando o bote!
A vagar por ruelas escuras
arriscando tropeçar n'algum mote,
afinal, as ruas estão semi-nuas,
e abusam dos seus decotes…
Num motejo da alheia dor,
almas que a dor inda não lapidou;
a fonte do riso jorra farta,
a das lágrimas, a rocha de Horebe;
aí a vara de Moisés fere,
e então, toda multidão bebe.
Após a ferida desaparece o pejo
e aparecem as partes ocultas;
o precoce fruto do ramo do desejo,
premia com responsabilidade adulta;
a viúva, no auto fúnebre do sonho,
flerta com o real, e o que ele faculta.
As digitais do homem-bicho
denunciam que ele pos sua mão;
basta uma olhadela no lixo
pra ler a vida dos filhos de Adão;
a descartar por capricho,
qualquer coisa que exija doação.
Ah, esse nada, todo enrolado,
nada substancial, dito seja;
num rápido cambiar da tela,
o temor que alguém veja,
o nauta deleta a verdade,
e abre à fantasia que deseja…