Poesia maltrapilha
Quem esse homem ama?
Quem ama esse homem?
De quem se fala?
Daquele moço ali.
O de terno?
Não.
O entregador do supermercado?
Não.
Falo daquele catador de papel.
Meu Deus!
Quem esse homem ama?
Quem ama esse homem?
Aquela roupa suja, aquela barba por fazer...
Os feios também amam.
São amados por outros feios?
São seres humanos.
Submetidos aos mesmos desejos, às mesmas paixões.
Catadores maltrapilhos também amam?
As condições são de homens
Jogados às margens, mas são homens.
A imagem daquele homem sujo,
Cujo hálito podia deduzir o odor,
Intrigara-me, incomodara-me.
Por trás da escória, um ser.
Por trás de um ser, uma dura e constante realidade.
Por trás daquela realidade, um coração.
Aquele homem poderia ter sentimentos?
Ora, mas os sentimentos não são perfumados de jasmim?
Os gracejos não vêm acompanhados de flores?
Em oposição aos pedaços de papel mortos, apagados...
Sem poesia?
Como um corpo que mal se sustenta
Sustenta como tração animal o carrinho de papelão?
Como o coração que mal conhece o amor
Poderia com amor amar?
Quem ama esse homem?
Quem esse homem ama?