Pensamento
O barco avança rasgando as límpidas águas oceânicas...
Nele, sou parte da carga humana envolta num misto de algazarra e silêncio
À minha direita, negras macambúzias sobraçam os parcos víveres...
Sustento da prole.
Enquanto seus homens se lançam desesperadamente aos mares bravios à cata de mais alimentos.
À minha frente outras pobres mulheres, calejadas do dia a dia,
estampam, na face, o ingênuo sorriso e a esperança de vencer...
E pensam:
Derrotar o tédio!
Vencer o medo!
Driblar a morte!
Sobretudo viver!
Porque viver é o maior risco.
As da esquerda também pensam e
sofrem...
Há, contudo, alguém na embarcação imune a mazelas.
Penso:
São uns bastardos...!
Uns mesquinhos...!
Que usam a exploração humana como escudo ou vivem às suas expensas.
À minha retaguarda nada vejo
Ninguém a pensar...
Nem a sofrer...
Só o salgado mar...
No centro, aqui estou!
Transportando-me para essas sofridas almas que nem as conheço.
E o albatroz se vai singrando sobre as águas límpidas e ondulantes...
Longe avisto o meu destino
Lá já está meu pensamento.
Poema publicado na Antologia:Poetas Brasileiros Contemporâneos - vol. 60 da CBJE.