ORAÇÃO A MÁRIA
Quem está na periferia,
Já esteve no centro um dia?
E, de lá, mais que saudades sente
Na sua indizível agonia.
Sente a dor de quem tem fome
De pão, de vida e alegria,
Sente a morte na sua alma;
Sua alma está vazia.
Então, este poema eu dedico
Àqueles que no dia a dia
Sobem e descem as escadas
A levar em romaria,
Do trabalho, o seu fruto,
Em oferendas, o sacrifício
Do seu sangue,
Para entregar
à Ave – Maria.
Porque ela é quem devia,
Do alto de sua glória,
Pender os olhos para baixo
E, recuperando a memória,
Dar a este povo sofrido
De volta a sua história.
Devia - a Nossa Senhora -
Oferecer com humildade,
Mais que este seu olhar terno
A cobrir a nossa cidade,
Mais que estas duas mãos postas
Rogando a Deus piedade.
Devias, óh Mãe, Devias.
Devias! E como eu queria
Que tu, ao invés de cobrar
O nosso sangue em honrarias,
Descesse a Senhora do Altar
E descesse as escadarias
E caminhasse por entre os mansos
Que da missão não desvia
E – com o olhar petrificado,
Coração à revelia,
Na carne as farpas do pecado –
Leva a cruz na sacra via.
Devias falar com José
-A Senhora que é Maria-
Para que ele construísse
Uma cadeira a cada dia,
E fosse ele mesmo entregar
Ao povo da periferia,
E doasse todas elas
A quem de fato devia
Descansar do seu trabalho
Na mais completa alegria,
Liberto de toda culpa,
Num recanto confortável
Num merecido sétimo dia.
Assim, óh Adorada Mãe santa,
De vez eu entenderia
Que a Senhora não falta nunca
Àqueles que sem Olaria
”Massam o barro, ”quentam o forno
E cozem tijolo a tijolo
E constróem, apesar do seu sono,
A casa da burguesia.
Que a Igreja, Óh! Santa Mãe minha,
Casa onde estás abrigada,
Pela mão do miserável
É que com fé foi levantada,
E também a escadaria
Por onde a Senhora é levada
Ao altar, prá no domingo,
Ser pelo povo abençoada.
Assim, este povo é que é Santo
E maior santidade não há
Que aquela de ter o Dom
De a matéria transformar,
Dela gerando alimento
E a casa prá morar.
Por isso óh! Santa Mãe querida
O verdadeiro milagre quem faz,
De fato, é a mão do povo
Que da labuta não se desfaz.
Que transforma o velho em novo,
E na mais completa humildade
Planta o trigo, assa o pão
E cria toda a realidade.
Tendo apenas como dolo
O prazer servil de ser tolo
E crer na santíssima trindade.
ABENON MENEGASSI