CAMPEÃO
Quer ganhar um trocadinho, Campeão?
O menino magrelo responde de pronto:
“Um trocadinho, eu quero seu moço, mas, não sou isso não.
Ser campeão é ter família unida igual aquelas que aparecem na televisão.
É ter comida pra encher a barriga e não sentir as tripas batalhando.
É não precisar perambular pelas ruas, sentindo frio e sendo enxotado
Como se fosse um cão sem dono.
Campeão, continuo a dizer. Aliás, insisto.
Está visível e reconheço...
Sua vida não tem sido fácil, e apesar da pouca idade,
E das muitas propostas recebidas,
Você optou batalhar pelo pão.
E o serviço que lhe ofereço é leve.
Se fizer bem feito, dar-lhe-ei a mão.
Aceito ganhar o trocado, pois gosto de trabalhar,
Mas... não sei se o senhor vai entender:
Minha barriga está roncando, pior que meu avô.
Minhas pernas qual geléia, não param de tremer.
Se começar sem encher o bucho,
Apagarei na certa... E o tranco...
Não vou conseguir fazer.
Ok. Entendi o recado. Venha comigo, Campeão.
Vamos até a cantina tomar um café reforçado.
E depois de barriga cheia, espero vê-lo em ação.
Não me decepcione, menino...
Não desperdice a ocasião.
Quando surge a oportunidade ela deve ser agarrada,
Nunca mais ela volta. Restando um choro vão.
O menino tagarela segue o moço bem formado.
Teve sua fome saciada, falou com desembaraço,
Depois fez o serviço com alegria, e disposição.
Foi assim recompensado: Passou a trabalhar na empresa,
Aprendendo o ofício, passo a passo.
Naquele primeiro encontro nasceu o inesperado:
Tornaram-se amigos, patrão e empregado.
O menino agarrou a oportunidade que lhe fora dada.
Estudava com afinco, venceu vendaval,
Formou família, em altos montes fez escalada.
Mas nunca esqueceu quem foi seu fanal.
Quando o patrão faleceu de forma inesperada,
Campeão já era ancião, estava aposentado.
No velório era apenas mais um de coração alquebrado.
Pediu com humildade para sua homenagem fazer.
E foi com voz embargada que fez cada ouvinte emudecer.
- Revelo nesse momento um segredo
Que por mais de trinta anos foi bem guardado:
Meu patrão era um homem de grande coração.
Um dia encontrou-me na sarjeta da vida,
Deu-me guarida, estendendo sua mão.
Fui menino de rua, comia o que encontrava no lixo,
Um dia ele me chamou, e me ofereceu serviço.
Matou minha fome, deu-me uma profissão,
Exigiu que eu estudasse, foi meu amigo,
Ouviu minha alma, sentiu meu coração.
E com voz vacilante, completou:
“Se não fosse esse homem, hoje não seria um Campeão.”
24/06/10