Nesses Tempos
Quem não sente falta de alguém está muito bem ou mal demais. Sobretudo nesses tempos em que se vive dizendo amém. Pra tudo o que é de mal. Pra pouca coisa de bem. Você nem bem me conhece, já desconfia. E crê que é uma regra sadia. Vivemos em melancolia. O sexo, uma terapia. Se feito na cama, no chão ou na pia. Mas não traz a essência de alguém. Porque ninguém é só corpo. É preciso que se tenha alguém que nos pergunte: você está bem? Ao invés de querer saber apenas se teu pau ainda sobe ou se a xana ainda molha.
Nesses tempos vazados de infortúnio, em que a televisão é uma parafernália de informações audaciosamente inquietantes e necessariamente estressantes, em que a retirada do plug da tomada ainda te dá a liberdade do silêncio; nesses tempos de gigabytes, Blackberry, vídeo conferências, responder e-mails da rua... em que você precisa estar antenado com tudo o que está em sua volta pra disputar com o cara do lado, normalmente mais jovem que você; nesses tempos em que a dicotomia virou tricotomia ou politomia e ninguém faz mais tricô; nesses tempos em que a corrupção virou instituição e se torna cada vez mais marginal o cidadão correto e honesto; nesses tempos de mundo cada vez mais gay e em que os sexos se fundem, desaparecendo a diferença de gênero... o melhor nunca será morrer. Até porque, de uma forma ou de outra, isso vai acontecer. O melhor será talvez escrever... poesia. Ou fazer hidroginástica.
Rio, 09/05/2010