Esse menino.

Respeita aquele menino

Que grita e chora: ele é um bebê, ainda

Leia no olhar dele

Toda sua carência e medo.

Observa o crescimento

Acompanha os movimentos

Esse menino pode aprender,

por tudo pode merecer.

O tempo passou e o menino cresceu

Corpo ferido, alma transparente

Sujeito do orgulho, prisioneiro do mundo

Enlouquecido por tudo.

Criança temida, olhos perdidos

Sangue aguado, células mortas

Vícios confundidos

Memórias tortas

Tá vendo esse menino?

Ele só tem quatorze anos

Tem as mãos caleijadas da lata que segura

Dos gramas de pó que inspira aos pulmões

Ele não entende de sociedade, cultura ou cidadania

É jogado em uma estrada, onde os carros trafegam em sua direção,

querendo destruí-lo,

é um corpo neutro nessa travessia.

É hoje, um pequeno infrator, autor de contravenções

Amanhã talvez, o chefe de sua "repartição"

Onde resolvem, administrativamente, onde e como vão fazer

Ou, quem sabe, não chegue tão longe.

Ele não respeita a mim, a você, a ninguém

É o dono de seu próprio mundo

Engole a seco qualquer investida e sai na rua

Aborda um, dois, quantos quiser, até ser pego

De novo na rua, tudo se repete

É um menino ainda, mas pode ser bicho, se esconde na mata,

no lixo, onde achar melhor

Ele é um segredo e mistério

Esse menino fala da maconha como se fala em brigadeiro,

é artista na arte de furtar, é artesão na arte de montar o bagulho

Ele da gargalhadas, ri até doer a barriga,

até que alguém o atinge profundo.

É com palavras que conseguem o atingir

Ele desafia, ele se atreve e grita: "não olhe para mim,

Não sou palhaço, não sou atração,

Sou apenas eu".

Talvez o menino se encontre um dia,

quem sabe até se perca de vez,

seja o que ocorrer, foi de uma infinita crueldade

o que o mundo lhe fez.