Motim
Denis Silva e Tiago Araújo
Sem consciência, sem dó nem piedade
O cotidiano é violento atrás das grades
Vários manos aqui dentro acham que exercem cargos majoritários
Revoltados pelo parceiro que pelo DENARC foi fuzilado
No domingo dia de visita é alivio pro carcereiro na prisão
Porque chega o reforço pra não estourar outra rebelião
Todos aqui na expectativa do advogado vir com Hábeas Corpus
Com o cu na mão dessa noite eles serem os próximos óbitos
O próximo que acaba sendo enforcado com lençol pelo companheiro
Porque pegou um maço de cigarro e a família não trouxe o dinheiro
Aqui não existe o art. 5º da CF do direito a vida
Porque aqui dentro quem aplica a lei são os diabos de cinza
Não tem escapatória nem pro mano que tenta se regenerar atrás da Bíblia Sagrada
O último que quis pregar a palavra na cela morreu na facada
Cada dia chegando mais um que só queria pagar de boy pras mina, de Fiat Stilo
Mas não sabe que aqui dentro o óbito é o mais provável destino
Caralho, vamo vê se hoje nóis vai dormir em paz
Ou se vamo presenciar mais uma cena de Alcatraz
Aqui só daria jeito se o pastor trouxesse uma cruz com explosivo
Pra matar presidiário, diretor, gambé e seus discípulos
Mas fazer o que se a gente ainda não tem uma perspectiva de vida
Morreremos caindo podre de AIDS ou seremos cobaia do universitário de Medicina
Eu não falo pra comover nem pra ninguém chorar
E sim pros manos raciocinar antes de roubar e vir pra cá
Não tem helicóptero seqüestrado pra vir te resgatar no pátio
Aqui é entra vivo e sair morto, desfigurado
Infelizmente terei que aumentar a estatística da carnificina
Vingarei a caguetagem batendo pênalti com a cabeça do traíra
Inimigo cusão vai agonizar na solitária
Com coágulo no cérebro por causa das cabadas
Saiu do trono, foi obrigado a abdicar ao reinado da cocaína
Entregou a faixa, sofreu impeachment, a manifestação não foi passiva
Tapa na cara, chute de coturno no saco, bala de borracha
Soco no estomago, imobilização, spray de pimenta e coronhada
Definitivamente anularam minha chance de conseguir meu alvará de soltura
Esfaqueei um estuprador, pedófilo filho da puta, não tive boa conduta
To ligado que alguns gambé aqui tem influência no crime organizado
Alguns traficantes, outros usuários, testa de ferro de deputado
Com Nextel entrei em contato com a Assembléia Legislativa pra financiar meu arsenal
Vou ganhar notoriedade com matérias no Brasil Urgente e no Balanço Geral
Não tem helicóptero seqüestrado pra vir te resgatar no pátio
Aqui é entra vivo e sair morto, desfigurado
Um mano meu veio com sacola de jumbo, revistado pelos gambé
Da cabeça aos pés, meteram a mão no saco mas a 9 passou escondida na tapawer
O Estado banca cada arma, cada objeto pontiagudo
Preso com intestino perfurado, membros amputados fazem parte do estatuto
Assim com a transferência de droga de um presídio para o outro
E a cerveja, o churrasco de picanha, costela e carne de porco
Enquanto bandidos de menor periculosidade se matam em celas lotadas
A chacina ocorrida no indulto de Natal, a depredação da penitenciaria
O mapa, a picareta, a pá, o início da escavação
A ameaça ao carcereiro, ao sentinela, a negociação da facilitação
O desejo incontrolável de explodir o coração do negociador de elite
Alguns se contentam em arrancar olho de talarico com uma AR 15
Enquanto não acabar essa putaria do Governo de não ter a educação pra priorizar
Não adianta prender, não adianta matar, o motim não vai acabar
Não tem helicóptero seqüestrado pra vir te resgatar no pátio
Aqui é entra vivo e sair morto, desfigurado