Odisséia brasileira

" ... dizem que antes de Ìtaca, Odisseu aportou no Novo Mundo ..."

Chego sem saber por que.

Retornado, sem nada para rever,

idiota que matou por dever

e cretino que perdeu a chance de morrer.

Estive na guerra de terceiros

e lutei tempos derradeiros,

crente na virtude dos guerreiros.

Agora estou regressado.

Paz não se conquistou,

pois comigo, só outro punhado

de zumbi sobrou.

Lutamos em todas as guerras

e morremos em todas elas.

Agora o aço perdeu o viço,

mas restou o maldito vicio

de buscar novo suplício.

Tempo perdido,

do qual tudo foi esquecido.

Tempo mal parido,

da boca do desconhecido.

O quê se fez do Brasil?

Disseram-me que aqui não haveria guerra,

e a vidente que não erra,

só me alertou para o perigo

da bala perdida que mata toda a gente,

e mais, se for inocente.

O quê se fez do brasileiro?

que de "tipo faceiro"

e "mulato izoneiro",

tornou-se alvo preferencial

e cliente em potencial

da funerária da esquina,

a "Gari" da mão assassina.

Por que estamos perdendo

o quê em séculos fomos aprendendo?

Donde ficaram as conversas nas calçadas,

o riso, o abraço, o beijo,

a goiabada com queijo

e a pura cachaça,

sem culpa, nem pejo?

Que fim levaram o amor, o cortejo,

o samba em solfejo

e a poesia d'algum realejo?

Por que tanta viela,

tanta favela

e tão pouca aquarela?

O que se fez do pandeiro?

Da Capela no outeiro

e do atabaque no terreiro?

O que fizemos do Brasil inteiro?

Para Beth, que hoje faria 51 anos. Beijos guerreira.