Mulher-dama

Escondida lhe mandava

mensagens de amor

e de desejo

Detalhava o gosto

do beijo

E o seu fogo carmim

Fugia pra sua liberdade

Sempre e ao cair da tarde

na penumbra dos jardins

Assim foram dias, meses, anos

Invisível sob os panos

até o marido descobrir

Resistiu, chorou, implorou

jurou juras de amor

promessas de mulher direita

que toma jeito na vida

deixa pronta a comida

e as roupas de dormir

Recebeu o esperado perdão

ganhou flores

um roupão

e um carrinho de feira

novo em folha

digno de uma dona caseira

mulher e rainha do lar...

Um dia abriu uma caixa bonita

amarrada com charmosa fita

juntou sonhos

pensamentos

delírios

numa pequena matula

que amarrou pela ponta

retirou do dedo o anel

e largou na cabeceira da cama

sobre um bilhete

escrito a batom:

com amor, Ana

saiu, ganhou a rua

de seu rastro

só o facho da lua

iluminando a imagem

da santa.